sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Goteiras - Gutters



De repente, no meio da noite, uma gota d’água cai e grita o meu nome.
Ela resmunga, reclama, finjo não ouvi-la.
A gota pinga novamente mas, desta feita, o faz com raiva, provocativa.
Ela pinga sobre a minha cabeça num estrondo terrível.
Pinga!
Ela pinga outra vez, e mais uma vez. 
Ela acorda o silêncio, espanta o meu sono que, resmungando, foge.
O meu sono foge, assustado, e vai se esconder bem longe de mim.

A gota d’água pinga em meu ouvido e o faz doer, faz-se doer em 
minha alma.
Dói! 
O meu ouvido dói uma dor que não dói como as outras dores doem.
As goteiras me provocam uma dor que, no meio da madrugada soam 
como tortura, algo que incomoda mais que qualquer dor.
A gota d’água pinga, ela pinga até me tirar da cama.  
Ela obriga-me a me levantar vezes e mais vezes até que, a minha 
paciência não suportando mais, me abandona. 

Aborrecido vou até à cozinha fechar a torneira que insiste em
permanecer pingando.
É uma torneira que já fechei infinita vezes sem, no entanto, estancar
a sua goteira que pinga, pinga quase me levando a loucura.
A torneira pinga e suas gotas ao baterem no fundo da pia parece 
chamarem o meu nome. 
Entendo elas murmurarem em meus ouvidos o meu nome e isto me
tortura, me torturam até o amanhecer quando o sono, cansando e 
sonolento, volta para mim.

De repente, no meio da noite, uma gota d’água pinga!
Ela pinga e ao bater no fundo a pia ela grita e o seu grito vai tão
fundo em meu ouvido que parece gritar em meu coração.
Sim, no meio da madrugada, as gotas que gotejam em meus 
ouvidos doem mais que qualquer outra coisa possa doer.
É a mais terrível aflição, é dor sem raiz, é uma agonia sem 
explicação.
As goteiras, no meio da madrugada, murmuram o meu nome.

                                     Lido da Silva - Brasília, janeiro de 2013.


                                            *
Gutters

Suddenly, in the middle of the night, a drop of water
Fall and screaming my name. It mumbles, it calls
And I pretend do not to hear it and then it drips
Again but, at this time, it does drips with anger, it
Does drips provocatively.
A drop of water drips on my head and causes a
Terrible crash on my ears. It drips, it drip again and
Again and wakes the silence. It terrify my sleep and
My sleep frightened runs away, it goes into hiding
Well far from me.
 
A drop of water drips on my body and hurts it,
It hurts my soul. It hurts; it hurts me with a pain
That does not hurt as other pains; it causes a type
Of pain that in the middle of the night bothers me
More than any other kind of pain.
A drop of water falls; it dribbles till get me out of
Bed, it forces me to get up again and again until my
Patience runs out. 

Anger I go to the kitchen to close
The tap which insists on to drip, a faucet that I have
Already closed infinite times without, however, get
It to stop its drops, a faucet which, its drips are
Driving me crazy.
The tap drips and when her drops hit the sink´s
Bottom it call my name. Her drops scream in my
Ears, they torture me, they torture me until dawn,
When my sleep, tired and sleepy, comes back to
Me.
 
Suddenly, in the middle of the night a drop of water
Drips! It drips and when it touch my body it screams,
The drips yells and its cry goes so deep in my ear that
Seems stare into my heart.
In the middle of dawn, the drops that drips into my
Ears hurt me more than a stabs, they are the most
Terrible afflictions, they are rootless pains, they are
The unexplained agonies.

                   *

3 comentários:

  1. Caríssimo poeta Mauro Lucio,
    que poema lindo!

    Ao lê-lo, tive a sensação de entrar nesse contexto e acompanhar passo a passo a trajetória em que você poeta tenta traçar um diálogo com o eu subjetivo e o real; com as questões postas pela realidade social, com o outro, com as dúvidas, os medos, os anseios, os conflitos que sempre fazem parte da existência humana! Belíssimo!
    Penso meu querido, que pela primeira vez eu consegui ler e traduzir um pouquinho o que diz a essência da linguagem poética!
    É certo que tem um grau de profundidade além de minha compreensão, mas fiquei feliz porque acho que entender a alma dos poetas não é uma tarefa tão simples! Requer sensibilidade, sintonia, e predisposição para a escuta sensível!
    Parabéns pela composição!

    Obrigada pelo encantamento e por nos proporcionar a suavidade em apreciar ao belo inerente a poesia!

    Que este seja o "passaporte" para muitas inspirações neste ano de 2013!
    Grande beijo, poeta lindo!
    Dorinha

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  2. Dear poet you chose to read only in English?

    In our mother tongue do not you enjoy more the opinion of their readers? (rs rs rs)

    With the help of an interpreter and a lot of effort, I'll try to repeat my look over your poem, okay? Come on ...

    If the translation was not good, please excuse us! Kissy...

    ”Dear poet Mauro Lucio,
    that poem is beautiful!

    While reading it, I get the feeling that context and follow step by step the path you poet tries to chart a dialogue with the subjective self and real, with questions posed by social reality, with others, with the doubts, fears, anxieties, conflicts that are always part of human existence! Gorgeous!

    I think my dear, that for once I could read and translate a little bit that says the essence of poetic language!
    Certainly has a degree of depth beyond my understanding, but I was happy because I understand that the souls of poets is not a simple task! Requires sensitivity, tuning, and predisposition for sensitive listening!
    Congratulations composition!

    Thanks for enchantment and for providing us with the smoothness inherent to appreciate the beautiful poetry!

    This is the "passport" for many inspirations this year 2013!”

    São desejos e um olhar muito sincero, poeta querido!
    Você é uma criatura especial!

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    1. Tudo tem o seu tempo... Ha o tempo para plantar e o tempo para colher. Ha o tempo para chorar e o tempo para sorrir... Nada nesta vida acontece antes do seu tempo. Querida Dorinha, obigado pelo seu lindo comentário e observação.

      - De repente, no meio da noite, uma gota d’água
      Cai e grita o meu nome - . É o retrato fiel de um espírito agoniado. No trecho a seguir, vencido, me deixo dominar.

      - A gota d’água pinga sobre a minha
      Cabeça e provoca um estrondo terrível em meus
      Ouvidos.- Aqui o silêncio e a solidão me incomodam.

      Nas tres linhas seguintes fujo para dentro de mim e la me escondo.

      Any way, é uma dissertação complicada que exige que o leitor penetre o âmago do que está escrito para só então ter acesso ao que não esta escrito e então ler com clareza tudo que este poema diz. Paciencia é o código para a perfeita leitura de quase tudo que escrevo. Meu beijo carinhoso para ti e muito obrigado por tua visita ao meu blog. Mauro Lucio.

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O “daqui a pouco”.

Não sou tolo para acreditar no que o “daqui um pouco” está a me contar. A farsa disfarça e  esconde a verdade sobre a qual ela não quer fala...